Verdade Chinesa

sexta-feira, 22 de março de 2013

Dr. ENEM

Há diversas falhas no sistema educacional brasileiro, e não há surpresa ou novidade nessa afirmação. Surpresa, de fato, ocorreu quando algumas redações do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) foram reveladas. Alguns estudantes, tentando testar o sistema de correção do exame, infiltraram propositalmente no meio de suas redações textos totalmente desconexos com o tema da dissertação. Fernando Maioto inseriu, na redação cujo tema era a imigração no século XXI, trechos do hino do Palmeiras. Sua nota? 50% do valor total: 500 pontos. E se você não sabe fazer uma redação decente mas sabe cozinhar, fique tranquilo. O mineiro Carlos Ferreira colocou receita de miojo infiltrada e adquiriu 560 pontos, que equivalem a 56% da nota total.
Como brasileira e estudante do ensino médio em instituição pública do país, não sei do que sinto mais vergonha. Se da precariedade do nosso sistema educacional ou da entrevista concedida pelo presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), Luiz Cláudio Costa. Quando questionado sobre o acontecido, afirmou: "Deve ter nota zero? Claro que sim. Mas temos que ter cautela, separar o joio do trigo. Pode ser que o estudante tenha um branco, saia do tema, mas faça com seriedade e depois volte ao assunto. Esse estudante não pode ser prejudicado".
Me perdoe se você faz ou fez o gênero do estudante que têm brancos na prova. Saiba que isso também acontece comigo as vezes. Mas quando isso acontece, eu saio da prova com a plena consciência de que não fui bem, que precisarei estudar mais para recuperar a nota perdida. E é isso que qualquer pessoa sensata pensa. Mas não o doutor Luiz Costa, que acha que esquecimentos devem ser perdoados. Pois que se perdoe todo e qualquer esquecimento então. Porque se perdoa o aluno que, pela pressão, fugiu do tema, e não se perdoa o aluno que, pela pressão, é claro, esqueceu de marcar as respostas no gabarito? Se o corretor acha que "deu branco" é uma desculpa plausível e aceitável, que faça-se justiça. Perdoe-se, então, todo e qualquer branco. Afinal de contas, esse coitado estudante também não pode ser prejudicado.
A verdade é que esse fato apenas ridiculariza ainda mais a educação no país e expõe a realidade da situação. O ENEM não examina nada. O ENEM é como aquele médico que te atende na emergência, tira a sua pressão e temperatura e diz que você está com virose. Que análise profunda o médico faz sobre sua doença? Qual é o reflexo que o ENEM faz da verdadeira situação educacional do país? O jornal O Globo revelou recentemente que algumas redações, cuja nota obtida foi a máxima (1.000 pontos) tinham graves erros de português. Enxergar, com ch. Razoável, com s. O MEC divulgou uma nota afirmando que erro de ortografia não significa que o aluno não domine o padrão da língua. Faz-me rir. O que nós estamos avaliando então? Se o estudante sabe escrever o próprio nome? Se sabe marcar as respostas no gabarito?
Não se engane. Os supostos ótimos índices alcançados no ENEM não querem dizer nada sobre a verdadeira situação educacional do país. Dizem apenas que temos corretores incompetentes e inaptos para tal função. Os estudantes de ensino médio brasileiro não estão sendo bem preparados e não estão tendo acesso a educação que merecem, e que, por lei, deveriam ter. Os resultados obtidos nesse péssimo método de avaliação da educação brasileira apenas maquiam a nossa triste realidade. Mas isso não a muda, não a transforma. Eu queria me alegrar com os índices alcançados. Bater no peito e dizer: esses sim, são os jovens do nosso país! Que futuro brilhante teremos! Não posso. Apesar de tudo, educação, infelizmente, a gente não vê por aqui.